UM CONTO DE
NATAL
Pedro
C. da Silva.
Nestes dias
de vésperas de Natal, em que se vive sob a autoridade neoliberal fascistóide,
me acode ao pensamento a sensatez do povo português da segunda década deste
século. Talvez também porque as cicatrizes que deixaram a ditadura autocrática
conservadora pré-capitalista, na qual o povo lusitano se quedou por cerca de
meio século e dela se libertou por iniciativa e liderança de militares adeptos
do comunismo, tenham lhe acicatado a razão e o motivado a concertar pelo voto a
base para a “geringonça”, acordo parlamentar que alçou o Partido Socialista ao
governo da República. Pelo voto
parlamentar que ensejou a “geringonça” socialista, o povo português consertou o
erro que cometera há alguns pouquíssimos anos ao eleger um parlamento que
entregara o poder governamental aos neoliberais furibundos e ágeis no malefício.
Agora, pois, lhe seriam restaurados os direitos econômicos e sociais que lhes haviam
sido violentados.
Este conto é
de Natal e, por isto, vou falar de Natal. E como não reportar a melhor
recordação de vésperas de Natal que eu tenho?
Foi em
Portugal e começou em Viseu, com a abertura das festas natalinas. O povo,
liberto então do neoliberalismo autoritário do estado mínimo pela formação de
um parlamento de liderança socialista, comemorava nos dias de vésperas da data
máxima cristã a restauração do que lhe fora arrancado pela austeridade econômica
e fiscal, tais como dois meses a mais de salários anuais, o mínimo para a vivência
digna dos beneficiários dos sistemas previdenciários, a revalorização dos
vencimentos do funcionalismo público. Foram fechados cerca de vinte por cento
dos estabelecimentos comerciais, principalmente restaurantes, logo no início
desta política de estado mínimo neoliberal. Aí ressurgira a mendicância, disfarçada como
pedido de auxílio para atender urgências, principalmente em Lisboa, depois no
Porto. Eu estava lá e vi.
Estava em
Portugal durante três das quatro últimas semanas outonais de ano anterior, como
fiz por anos seguidos, e assisti a movimentos populares vigorosos contra aquela
política governamental neoliberal, submissa às exigências da troika - banco
central europeu, FMI e UE. Entre as manifestações de protesto a que mais havia me
atentado fora a interdição das duas mãos de trânsito na Ponte Vinte e Cinco de
Abril, que permite o trânsito rodoviário entre Lisboa e Almada sobre o Rio Tejo,
por dezenas de autocarros (ônibus) de diversos concelhos (municípios) compreendidos
na região da capital lusitana. Impressionou-me não só a massa de veículos mas
também o inteligente trabalho dos seus condutores que, para o bom sucesso da
sua movimentação mantinham a velocidade dos veículos qualquer coisa acima do
zero, apenas movimentando-os para evitarem a multa por paralisação sobre ponte.
Os veteranos de guerra também se movimentaram na altura (ocasião) contra a
austeridade econômica e fiscal implantada, que estava a levar Portugal cada vez
mais para a derrocada não só econômica – a dívida pública sempre a subir, o PIB
estagnado – como principalmente social, decorrente da rápida elevação dos
níveis de desemprego, tal qual não se presenciava há muito.
Nesse
contexto, em um início de noite fui a uma taberna típica (restaurante popular)
nos arredores de Queluz, com o propósito de saborear um caldo verde, e lá fiz
conhecimento com um veterano da Marinha de Guerra portuguesa, que adentrara ao
estabelecimento para beber algo. Como na tasca (bar de restaurante popular) as
três mesas existentes estavam ocupadas e ele bebia em pé, apoiado no balcão, o convidei
a se sentar à mesa que eu ocupava; ao que ele se recusou sob a desculpa de que
sempre bebia ali naquela postura, e invocou o testemunho da rapariga (moçoila) que
atendia a todos ali. Ele não se sentou, serviu-se como alegou ser do seu hábito
e mantivemos uma longa conversa, entrecortada de quando em vez por poses para
fotografias daquele encontro. Ele vestia fatiota militar, com quepe azul
marinho de lã, medalhas na lapela do casaco igualmente azul marinho de lã. Vivamente
emocionado, falou que viera da manifestação dos veteranos de guerra em Lisboa contra
a política governamental neoliberal obediente à troika. Ao cabo, diante da
minha entusiasmada solidariedade aos que em Portugal penavam por causa daquela
nefasta política, me entregou de presente o seu broche de veterano de guerra, retirado
da lapela do seu casaco militar.
Alguns
outros portugueses do povo, ante as amarguras econômicas porque passavam, compartilharam
comigo também manifestações de posicionamento resoluto contrário àquela
política da troika aplicada a Portugal, à qual reagiram os governos da Grécia e
da Itália, endividados tal como Portugal, e que se saíram melhor logo. Em Barcelos, a comerciante de uma pequena loja,
a se reclamar dessa política, disse a mim que seria ótimo se o ex-Presidente
Lula fosse para lá e governasse o país.
Essa a causa
intrínseca daquela extrínseca manifestação memorável do povo a comemorar a
abertura do Natal em Viseu sob os novos ventos socialistas, sem menoscabo à
edilidade local que enfeitou a cidade como merecia em face do renovado tempo de
prosperidade que se iniciava para o país e para o povo português. Protegido do
forte frio por vestimentas adequadas, a populaçao não arredava o pé da feira
natalina, do rocio (praça principal da cidade), da Rua Direita, dos outros espaços
centrais disponíveis para tal, a comemorar desde aqueles dias de vésperas de
Natal o início da sua restauração econômica e social sob o governo de liderança
socialista.
Presenciei a mesma comemoração da população no
Porto, em Póvoa de Varzim, em Lisboa e outras cidades portuguesas, com suas
luzes e árvores natalinas maravilhosas. Afora as comemorações em Viseu, me
tocou muito a preparação natalina em Seia, com pinheiros natalinos de médio
porte deitados nas calçadas para venda aos passantes pedonais (transeuntes). E
o povo, lá em Seia, na Serra da Estrela, mesmo com bastante frio, a vender, a
comprar, a passear, a sorrir, a conversar, feliz por voltar a viver um tempo
melhor, sob governo de liderança socialista.
Maria
Farinha, de 23 para 25 de dezembro de 2.021.
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