quinta-feira, 18 de julho de 2024

CAPÍTULO I A antiguidade greco-romana. 1. Grécia – A propriedade comunitária e o surgimento da propriedade privada. (Revisto).

 

CAPÍTULO I

A antiguidade greco-romana. 

1.                Grécia – A propriedade comunitária e o surgimento da propriedade privada.

ENGELS cita a História da Grécia, de Grote, para descrever dez elementos característicos que uniam a gens ateniense, entre os quais menciona “a posse, em certos casos, de uma propriedade comum, com um arconte (magistrado) e tesoureiro próprio” .1[1]

No início, os povos originais da Grécia tinham organização comunitária, como Assinalado por Max BEER:

“Estes dois povos ocupam um posto de destaque nos anais do socialismo. Os espartanos, em geral os dóricos, foram os praticantes, assim como os atenienses, e em geral os jônicos foram os teorizantes, do comunismo e do regime econômico igualitário.” 2

Com a expansão da propriedade privada, das cidades, das guerras e da colonização, que trouxeram novas riquezas e novos hábitos, aparecem a opressão dos ricos e a injustiça crescente quando, por cerca do século 700 a.C., surgiram as leis de Licurgo, considerado grande líder e legislador, objeto de elogio por Max BEER – “O primeiro legislador a quem a tradição atribui a obra da revolução comunista” – e de relevante referência por Plutarco:

“A... instituição de Licurgo, talvez a mais ousada, foi a repartição das terras. Reinava naquela época em Esparta uma desigualdade extraordinária. Achava-se a cargo do Estado uma multidão de homens pobres, enquanto as riquezas afluíam a um exíguo número de famílias, o que suscitava a arrogância, a inveja, a fraude e a prodigalidade. Com o objetivo de suprimir completamente todos esses males e ainda outros muito mais graves que o Estado sofria como conseqüência da riqueza e da pobreza, Licurgo persuadiu os cidadãos a que entregassem suas terras à coletividade, e repartissem de novo entre eles e vivessem juntos em uma igualdade e em uma comunidade de bens absolutos, de modo a que não buscassem outra vantagem que não a virtude, e que não existissem outras desigualdades e diferenças exceto as que implicam os elogios pelas boas ações e as reprimendas pelas más.” 3[2] 

Pelas leis de Licurgo, as terras nas cercanias de Esparta foram divididas em 9 mil partes e foram adotadas medidas que restringiram a economia monetária. Idem

Os sinais da decadência da organização gentílica principiaram a ocorrer na época heróica grega, quando a Ilíada e a Odisséia foram definitivamente redigidas, com o direito paterno de herança; a acumulação de riquezas na família; os rudimentos de uma nobreza hereditária e a monarquia; a escravidão não só dos prisioneiros de guerra, mas até de membros da própria gens; o enriquecimento regular por guerras sistemáticas entre tribos, na busca de capturar terras, gados, escravos e outros bens.

As guerras e a intensificação do comércio e da navegação, contribuíram para a divisão da sociedade em classes já no no século VI a.C., pelo que resumiu ENGELS que a constituição gentílica foi pervertida para se permitir a acumulação de riquezas pelo roubo e pela violência, ao que somente faltava uma instituição para assegurar as novas riquezas individuais contra as tradições comunitárias gentílicas e perpetuar o direito da classe possuidora de explorar a não possuidora e o domínio da primeira sobre a segunda, e rematou:

“ Essa instituição nasceu. Inventou-se o Estado”. 4[3]

Por essa época, os atenienses, que habitavam a Ática, assumiam crescentemente a exploração do comércio marítimo no Mar Egeu, no lugar dos fenícios, e a terra já se encontrava repartida em propriedades privadas, cujas compras e vendas e a gradativa divisão do trabalho entre a agricultura e os ofícios manuais, comércio e navegação causaram a confusão entre os membros das gens, fratarias e tribos. 

O surgimento da propriedade privada dos rebanhos e dos objetos de luxo trouxe o comércio individual e a transformação dos produtos em mercadorias, inclusive com a distribuição das terras conquistadas aos vencidos nas guerras travadas, a originarem o cultivo individual da terra e, em seguida, a propriedade individual do solo. Os pequenos agricultores da Ática, sem a proteção dos laços que as gens lhe proporcionavam, ficaram a mercê dos possuidores de dinheiro, mediante o crédito e a hipoteca das suas terras, levando-os à ruína. 5[4]

Com o desenvolvimento do capital comercial, Atenas transformou-se de estado agrícola em uma potência marítima, passando a depender do trigo transportado desde o norte do Mar Negro e outras regiões, conforme repertoriado em por MAYER: 

“Os grandes proprietários se converteram em capitalistas e viveram de suas rendas daí por diante, confiando os seus empreendimentos agrícolas a administradores que trabalhavam com a ajuda de escravos.” 6

Registra Malta CARDOSO que: 

 “A Grécia conheceu os primeiros percalços da propriedade privada, pelo exacerbamento injusto de seu egoísmo funcional. De um lado as conquistas levaram à escravização, povos inteiros, de outro, a contingência das explorações agrícolas de um lado, o advento e o desenvolvimento do comércio, principalmente do dinheiro começaram pelo regime das hipotecas (grandes pedras que marcavam as propriedades rurais dadas em garantia aos credores por seus donos) e de suas execuções, a conduzir a propriedade privada para as primeiras concentrações anti-sociais.”7[5]

                Malta CARDOSO também assinalou que Bernardino C. Horne teria consignado, in “Política Agrária y Regulación Economica”, que: 

“Solón, condonó las deudas hipotecarias y ordenó uma distribuición da la tierra ... Le recuerda que la decadência de Esparta se inició cuando Epidateo dispusó que todo ciudadano podia disponer libremente de sus tierras.”8 

Pinto FERREIRA, em adensado resumo, dissertou sobre a questão agrária na Grécia antiga:

“Os trabalhadores livres então tiveram de lutar simultaneamente contra o capitalismo e contra a concorrência do trabalho escravo. A propriedade agrária se concentrou. J. Toutain estudou esse problema. A princípio a propriedade rural, na Tessália, na Grande Grécia, na Ática, na Élida, estava bem dividida. A maioria dos imóveis rurais tinha uma extensão de 6 a 50 hectares; eram propriedades médias, existindo também um sem-número de pequenas propriedades, abaixo de 6 hectares. Era uma exceção o latifúndio de Fenipo, na Ática, com 300 hectares. A situação se repetia nas ilhas do Mar Egeu, como Tenos e Quios, nas cidades da Grécia asiática, em Hilicarnasso e Iasos: a terra estava dividida em pequenos lotes. Aristóteles dizia que ninguém era miserável. Exceto os ecravos, acrescentamos. Depois essa situação muda profundamente, com o advento do latifúndio, com o desenvolvimento do capitalismo e da escravidão.” 9 

Desde a Grécia antiga, a detenção privada do bem primário de produção por excelência, gerando o latifúndio, aparece na história como causa essencial da questão agrária.



(1)    (1) Friedrich ENGELS, A origem da família, da propriedade privada e do Estado, Edit. Vitória Ltda., 1964, Rio de Janeiro, p. 81.

(2)     (2) Apud Pinto FERREIRA, Curso de Direito Agrário, Editora Saraiva, 1994, os. 35-36.

 (3) Apud Pinto FERREIRA, idem, p.39.

 (4) Friedrich ENGELS, op. cit., p. 89.

(5) Id., 89/91.

(6) História da Antiguidade, apud Pinto FERREIRA, op. cit., p. 41.

(7) Malta CARDOSO, Tratado de Terras do Brasil, 2.º vol – Parte Geral, Edit. Saraiva, 1954, S. Paulo ps. 263/264.

(8) Ap. Malta CARDOSO,op.cit,, p. 264.

(9) Pinto FERREIRA, op. cit., p. 41.

 

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